O versículo de Mateus 18:28 nos apresenta uma dura realidade sobre a natureza humana: a capacidade de receber perdão e, ao mesmo tempo, negar misericórdia a outrem. A parábola do servo inclemente é um espelho que reflete nossas próprias falhas, expondo a fragilidade de nosso compromisso com o perdão quando confrontados com nossas próprias imperfeições.
O servo que devia uma imensa dívida ao seu senhor recebeu um perdão extraordinário, uma graça incomensurável. A dívida, simbolizando nossos pecados diante de Deus, era exorbitante, impossível de ser quitada por meios próprios. No entanto, o perdão foi concedido, livre e gratuitamente. Este ato de misericórdia deveria ter gerado um coração grato, transformado e capaz de estender a mesma compaixão aos outros.
Mas o que vemos? Um coração endurecido. A imensa dívida perdoada não gerou compaixão, mas sim um comportamento cruel e implacável em relação a um companheiro que lhe devia uma quantia insignificante em comparação. A fúria e a sede de vingança obscureceram completamente a experiência transformadora do perdão recebido.
Este servo representa, infelizmente, muitos de nós. Recebemos o perdão ilimitado de Deus, um amor que transcende nossa compreensão, mas frequentemente falhamos em estender esse mesmo perdão aos que nos magoam, aos que nos devem algo, aos que nos causam dor. A nossa própria experiência com a falibilidade humana se torna um obstáculo para a prática da misericórdia. Preferimos a justiça, mesmo que implacável, em detrimento da compaixão.
A parábola não é apenas um conto moral, mas um chamado à reflexão. Ela nos convida a confrontar a hipocresis que reside em nossos corações, a reconhecer nossa tendência a nos apegar à amargura e à vingança. A pergunta crucial é: se recebemos misericórdia, como podemos reter a misericórdia de outros? O perdão verdadeiro não é um sentimento, mas uma escolha consciente de libertar-se do peso da amargura e imitar a graça divina que nos foi tão generosamente concedida. Somente quando internalizarmos verdadeiramente a magnitude do perdão recebido poderemos, por nossa vez, ser instrumentos de misericórdia e compaixão para aqueles ao nosso redor.